Fábrica de Vespas, de Iain Banks
18:47Talvez seja bom estar com a cabeça boa antes de decidir dar inicio à leitura de Fábrica de Vespas. Trata-se de um livro extremamente inquietante, perturbador e incômodo, em todos os sentidos da palavra.
Desde o seu anúncio, no Caveira Talk Show, esse foi um dos livros que mais me chamaram a atenção. E para aqueles que acham que leitores estão se entregando apenas à aparência dos livros: Até então tudo o que eu tinha eram os títulos e, com um pouco de pesquisa, a sinopse do Goodreads.
E foram exatamente essas duas características que me entregaram ao Fábrica de Vespas e me fizeram aguardar com certa ansiedade por esse lançamento.
O livro é narrado em primeira pessoa por Frank Cauldhame, um menino excêntrico e, para não tardar com as características mais pesadas do garoto, mau até o talo.
Frank vive com o seu pai em uma pequena ilha na costa da Escócia. Mas nem sempre na casa foram só os dois. De fato, se for para nos atentarmos para os que já não moram lá, poderíamos elaborar um pequeno esquema por ordem de partida. Primeiro, sua mãe foge logo após dar a luz ao garoto. Depois é hora de dar adeus ao pequeno Paul, o irmão mais novo de Frank. O pobrezinho teve uma morte trágica totalmente arquitetada e executada por Frank. Não tão em seguida, Eric, o filho mais velho teve de ser confinado em um hospital psiquiátrico depois de um trauma que se refletiu em uma insanidade sem igual, o fazendo atear fogo em cachorros e forçar crianças a comerem minhocas.
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"Dois anos após eu ter matado Blyth, eu matei meu irmão mais novo Paul, este, por motivos muito mais fundamentados e razões diferentes. Um ano depois, eu fiz o mesmo com a minha jovem prima Esmerelda, desta vez, mais por um capricho.
Essa é a minha pontuação até a data em questão. Três. Há anos eu não mato ninguém, e não pretendo fazê-lo nunca mais.
Eu estava apenas passando por uma fase."
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"Nunca fui registrado. Não tenho certidão de nascimento, cadastro no Seguro Social, nada que diga que estou vivo ou que sequer existo. Sei que isso é ilegal, e meu pai também sabe, e acho que de vez em quando ele se arrepende dessa decisão tomada há dezessete anos, nos seus tempos de hippie anarquista, ou seja lá o que tenha sido."
A paz deveria reinar na casa da família, mas a notícia de que Eric fugiu do hospital psiquiátrico desestabiliza qualquer possível clima pacífico. Eric não está nem um pouco bem, e o leitor tem acesso às crises histéricas do rapaz através de ligações que ele faz para o irmão. O nível de loucura de Eric é demais até mesmo pra Frank, que mesmo sendo capaz de cometer tantas atrocidades quanto o irmão, sabe que o faria na calada, arquitetando cada movimento de modo a convencer todos de sua inocência.
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"Não incomodo as pessoas e é melhor que não me incomodem, se sabem o que é bom pra elas. Eu não saio por aí dando cães carbonizados de presente nem assustando os bebezinhos da vizinhança com porções de larvas ou um bocado de minhocas. [...] Aprendi a viver com a minha deficiência, e aprendi a viver sem mais ninguém, então não me abalo."
Não se sabe onde Eric está, mas sabe-se que a sua aproximação da ilha é certa, e a cada dia que passa, florescem os receios e angustias de Frank à cerca do que pode acontecer com a chegada do irmão. Angus, o pai dos irmãos, vai demonstrando cada vez menos força para lidar com a fuga de seu filho. Eric é um fardo que ninguém quer carregar, é uma mina de problemas. Perdido demais para a insanidade e sem chance de voltar ao normal.
O cotidiano de Frank segue seu curso normal, porém, agora pontuado pelas ligações de Eric -todas feitas com sigilo. É notável, também, a intensificação das manias de Frank: A aproximação do irmão desperta nele o sentimento de controle de tudo ao seu redor.
É com isso que o leitor conhece a Fábrica de Vespas, a teologia de Frank Claudhame. Para não estragar a experiência de futuros leitores, eu não vou dar detalhes sobre a fábrica, mas trata-se do lugar onde Frank obtêm suas respostas, é o que influencia na maioria das decisões do garoto. O jeito que isso acontece é um assunto perturbador, e que deve ser deixado para a descoberta dos futuros leitores.
É com isso que o leitor conhece a Fábrica de Vespas, a teologia de Frank Claudhame. Para não estragar a experiência de futuros leitores, eu não vou dar detalhes sobre a fábrica, mas trata-se do lugar onde Frank obtêm suas respostas, é o que influencia na maioria das decisões do garoto. O jeito que isso acontece é um assunto perturbador, e que deve ser deixado para a descoberta dos futuros leitores.
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"A Fábrica de Vespas é parte do padrão porque é parte da vida e - até mais do que isso - parte da morte. Assim como a vida, ela é complexa [...]."
Esse livro é uma incessante sequencia de socos na boca do estômago. Por ser narrada em primeira pessoa, a história vai sendo entregue aos poucos para o leitor e com uma veridicidade duvidosa, visto que se trata de um adolescente psicopata narrando o seu cotidiano anormal. Frank segue à risca uma série de rituais autoimpostos que ferram com a cabeça do mais centrado leitor, simplesmente não tem como deixar os ideais do garoto passarem em branco. Verdades ou não, a tensão proposta é real. Diferente do terror, o leitor não paga por aqueles sustos de vez ou outra, mas sim por uma constante sensação de impotência diante de um cenário que, estranhamente, mescla morbidez e caos.
Recomendo que o leitor não se prenda à nenhuma opinião que venha a ter durante a história, embora seja impossível não especular sobre um desfecho para a história. Fábrica de Vespas vai por a prova qualquer ideia que você possa ter sobre Frank, Eric, ou a família Claudhame. Uma coisa é certa: Qualquer pessoa com a mente sã vai sentir asco em muitas partes do livro. A repugnancia permeia tanto situações quanto os pensamentos de Frank - Embora eu deva reconhecer que alguns devaneios do garoto são geniais e são, na minha opinião, verdades sobre a sociedade.
Aquele que se arriscar pelas páginas desse livro deve saber que está dando entrada em uma dimensão perturbadora: a mente em formação de um psicopata. Mas deve saber, também, que nem tudo é o que parece. As coisas são como são por um motivos que merecem ser destrinchados, sempre é assim. Idéias, pessoas, a sociedade como um todo é feita de estalos, episódios que mesmo esquecidos, são ainda influentes. E assim como a sociedade é esquematizada em ideais e regras estabelecidas por convenção, também é Frank e, apesar dos pesares, ter um acesso intimista a sua mente é uma experiencia alucinante.
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